O mais recente trabalho de Bong Joon-ho, “Mickey 17” (2024), carrega sua assinatura inconfundível: uma comédia satírica permeada por um olhar metalinguístico e estilizado. O filme tem um enredo bem amarrado e até mesmo didático, o que pode torná-lo acessível a diferentes públicos sem perder sua complexidade.
Entre os destaques está a atuação de Robert Pattinson, que interpreta Mickey Barnes. Seu personagem, um clone designado para missões suicidas em um processo de colonização interplanetária, entrega um equilíbrio interessante entre humor e tensão. No entanto, há um ponto de incongruência na virada do ato final: a mudança brusca de personalidade no “Mickey 18” pode parecer um tanto abrupta, impactando a coerência da narrativa.

O filme também conta com um elenco de peso, incluindo Steven Yeun, Naomi Ackie, Toni Collette e Mark Ruffalo, que ajudam a construir o universo distópico de maneira convincente. Ainda assim, uma das lacunas do roteiro é a falta de desenvolvimento de Sasha (Steven Yeun). Quem ele era antes de estar ali? O que o levou a essa colonização? Essas perguntas ficam em aberto, e a ausência de respostas limita o impacto emocional de sua jornada. Talvez um aprofundamento maior desse arco trouxesse mais peso à trama.
Outro ponto fraco do filme é o tratamento dispensado a alguns personagens secundários, como Kai (Naomi Ackie) e Gemma (Toni Collette). Ambas começam cumprindo funções narrativas simples e, depois, são praticamente esquecidas ao longo da história. Isso faz com que suas presenças pareçam artificiais, sem um impacto real no desenvolvimento do enredo ou no arco de Mickey.

Bong Joon-ho, conhecido por mesclar gêneros e explorar críticas sociais em filmes como “O Hospedeiro” (2006), “Expresso do Amanhã” (2013) e o vencedor do Oscar “Parasita” (2019), mais uma vez insere sua visão única em “Mickey 17”. A sátira presente no filme remete ao humor ácido de “Expresso do Amanhã”, enquanto a abordagem de desigualdade social e sacrifício lembra elementos de “Parasita”. No entanto, “Mickey 17” tem um tom mais acessível e até didático, o que pode agradar um público mais amplo, mas pode decepcionar quem espera uma abordagem mais densa e provocativa.
Apesar de não ser o melhor filme de Bong Joon-ho, “Mickey 17” ainda se destaca como uma obra acima da média. Com um estilo visual característico e uma narrativa que equilibra humor e crítica, o longa reafirma o talento do cineasta em criar universos peculiares e instigantes. Para os fãs de sua filmografia, é uma experiência interessante, ainda que não atinja o ápice de sua criatividade.